terça-feira, 3 de agosto de 2010

falsidades

A única revista que actualmente recebo regularmente em casa é a L+Arte que considero a melhor revista de arte portuguesa. A razão principal desta predilecção que a minha mulher me insuflou, é as crónicas impecavelmente íntegras da Raquel Henriques da Silva. E, a seguir, acho piada a ver as coisas da arte. Mas hoje trago-vos nota de um artigo do historiador Joaquim Oliveira Caetano que saiu este mês. É um artigo bom intitulado “Falso!” que me obrigou a passar o dia a pensar em palimpsestos, palavra uberemente poética que nunca consigo exorcizar, quando me assoma ao dia.

 

(Já sei. Vou fazer um ocr para que fiquem com ele, por não estar online. Quem é amigo, quem é? Aí vai:)

 

Poucos temas da arte passam com tanta facilidade para o grande público e para os meios de comunicação como a descoberta de um falso. O aspecto policial do logro e da astúcia tomam o interesse de um thriller e os valores assombrosos por vezes pagos no comércio de arte ajudam a dar um popular ar de justiça divina ao engano milionário. Mas, de facto, em boa verdade, é muito difícil que um falso escape, hoje, à bateria de exames que se podem fazer para o conhecimento material de uma obra de arte e, talvez por isso - pela extrema pormenorização com que se podem observar suportes, preparações, pigmentos e meios -, o 'falso", nas suas várias cambiantes, tenha passado a ser também um tema de estudo da História da Arte.

 

Em dois congressos em que estive nos últimos anos, sobre pintura flamenga, houve comunicações e discussões sobre a "atribuição" a este ou àquele falsário, e duas grandes exposições, nos últimos anos, trataram diferentemente o tema: uma no Museu de Arte e História de Genebra, "L'art d'imiter", comissariada por Mauro Natale e Claude Ritschard, em 1997, dedicada às cópias e falsificações sobre pinturas da Ranascença Italiana, e outra, no Groeningemuseum de Bruges, em 2004-5, devida a TilI-Holger Borchert, van Schoute e Héléne Verousgstraete, dedicada aos primitivos flamengos, sob o título "Fake or not Fake - Restaurateurs ou faussaires des Primitifs Flamands". Esta última centrava-se em grande parte na figura de Joseph Van der Veken, um dos mais talentosos restauradores, peritos e, por vezes, falsificador, do século XX. A sua enorme habilidade e conhecimento da técnica dos pintores primitivos flamengos possibilitava-lhe completar pinturas com imensas áreas de lacunas, ao ponto de ser muito mais o refeito do que o original. O restauro extensivo é apenas uma das formas das cambiantes entre o falso e o original. Mas talvez a forma mais vulgar de consumir "gato por lebre" seja a involuntária (pelo menos quase sempre) má atribuição, o erro do historiador ou do perito.

 

A exposição que a National Gallery de Londres têm aberta até 12 de Setembro, "Close Examination: Fakes, Mistakes and Discoveries" é o mais bem conseguido ensaio que conheço de transformar o problema dos "falsos" num real e interessante problema de História da Arte. A exposição mostra apenas um "verdadeiro falso", isto é, uma obra feita de ponta a ponta com a intenção de conseguir proventos através da sua venda enganosa: um retrato de grupo da família Montefeltro, sobre o qual, muito antes das análises científicas o provarem, já recaíam suspeitas, dado representar padrões de tecidos e formas de usar adereços pouco aceitáveis para o século XV. Todos outros casos mostrados são mais interessantes. Um fantástico retrato de Alexander Mornauer viu o seu fundo recoberto de azul para o tornar mais próximo de Holbein e gozar assim da fama que o pintor tinha na Inglaterra. Uma mulher alemã do século XVI vê-se emagrecida e de cabelo mais escuro, para se tornar mais vendável, ao gosto pré-rafaelita. As pinturas de um tecto de Ferrara são esquartejadas para se tornarem mais atraentes; pequenos quadros profanos agradáveis em qualquer salão. Em todos estes casos, descobrir o "falso"é descobrir a história por que passaram as pinturas e como se foram adequando aos gostos, ao mercados e às expectativas de outras épocas. A exposição apresenta quase 30 exemplos (nem todos com correspondência no breve catálogo) que são, ao mesmo tempo, demonstrações das técnicas de abordagem científica do processo criativo e interessantes estudos de caso de problemas que vão sendo resolvidos do ponto de vista da História da Arte.

 

Por fim, gostaria de sublinhar dois aspectos. Em primeiro lugar as preocupações "científicas" da National Gallery datam do século XIX, dado o problema da poluição no centro de Londres e os seus efeitos na pintura. Desenvolveram-se muito, depois da II Guerra, também com a descoberta, quase colateral, dos efeitos benéficos que o ambiente estável das minas de Gales teve nas obras enquanto lá estiveram defendidas dos azares do conflito. Depois da II Guerra, o laboratório desenvolveu-se a par com as dúvidas da História da Arte e o aumento de tecnologia disponível, mas sobretudo pela necessidade de preservação do objecto artístico. Isto é, mesmo a tecnologia de ponta na investigação resultou, em última análise, do esforço dos museus para preservarem do tempo os objectos que guardam. Voltaremos a esta ideia, porque o óbvio tem andado esquecido entre nós.

cojones e animales

Sempre que em qualquer lado se faz um referendo ao aborto, surgem os eufemistas do “pró-vida”, para dar a entender que os seus opositores querem pôr na lei que é preciso fazer morrer pessoas. Com a proibição das touradas na Catalunha é extraordinário que aqueles que querem ir a um sítio ir ver espetar ferros pontiagudos e coloridos em touros, escolham o eufemismo “pela liberdade”. Presume-se que lutem pela liberdade de furar os costados do animal. Um touro sim, um cão, não, que é violência. Imagino que garantir essa liberdade, mas em relação aos homens seria coisa interessante. Quero espetar um garfo no olho do senhor guarda nacional republicano que me passou uma multa, o fascista. Nada mais simples. Grito “Liberdade, liberdade, liberdade”. Sou, de repente, um pró-liberdade. Na cadeia. E diz o el mundo que “triunfaron los animales”. Visto daqui, dá a entender que “animales” são os que perderam.

Por falar em animales e gente que luta pela liberdade de disparar de helicópteros contra animales. Sarah Palin diz que o Obama não tem “cojones” para resolver a questão da imigração. Especialistas. Temos de escutar os especialistas. Parem lá de rir. Aqui.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

noven(t)a

No dia em que o Ray fez anos. O Deus, os monstros e os anjos.

memo

Não sei o que pensam fazer no próximo 7 de Agosto, mas se os vossos planos não incluem vestir o melhor fato, pôr o melhor vestido, envergar a melhor disposição ir ver a Carmen Souza e o Theo Pas’cal  ao CCC, é porque faz-vos sentido passar ao lado das coisas. E não é suposto ser assim. É memo para seguir. Elucidativo é ver as influências que a moça selecciona no seu myspace: Ella, Weather, Jaco, Joni, Bill Evans, Zawinul, to name a few. E o que tem de ser…

domingo, 1 de agosto de 2010

feissebuque

Agora que, nas escolas, já ninguém chumba, nem por faltas, nem por coisa nenhuma, só para que o insucesso enfim diminua (isto é de gargalhar), a autoridade dos professores, deve confessar-se, sai reforçadíssima. A autoridade dos alunos é que caiu por terra. Senão vejamos: ['té parece que já me estou a ver a dizer aos alunos].

 

"Amiguinho, o menino acha que está por aqui a mais e não lhe apetece estudar, não é? Shtá borrecido. Atão, faça-nos lá o obséquio de ir dar uma volta ao bilhar grande. Está-se bem, 'tá-se tão melhor na rua, co'este solinho. No sequei-te parque. Como? Falta? Que falta? Ná. Não sabe a última? Ah, poizé, você não lê jornais. Não lê nada, de resto, a num ser éssémiésses, aifaive e feissebuque. Esteja o infante descansado, porque assimcumássim o menino nem chumba por causa das faltas. Sim. A sério. Palavra de honra que é verdade. Se quiser até as pode justificar porque é preciso que as justifique para que sim. b'tarde. Ó Mariana, agora que o Fábio has left the building, acabe lá de ler o texto do Descartes. Sim, a parte dos Universais."

 

Agora é assim: se por ventura, um jovem tem em casa quem lhe ensine a importância de aprender coisas e saber mais, tudo se segura. Caso assim não seja, e o que mais há neste país é gente a achar que a escola não ensina nada que se aproveite - numa época em que ninguém percebe os clássicos, a culpa é dos clássicos - então resta aos meninos o sempiterno e omnipresente bilhar grande. E não há-de ser às três tabelas, que isso exige cálculo. Há-de ser às três pancadas.