sexta-feira, 15 de abril de 2011

Gasto

"Desculpe, Sr. Correia, mas não temos."

"Mas se eu não tenho cheques, porque não os uso desde, para aí, os anos oitenta e não ando habitualmente com 1111 euros no bolso, como espera você que eu pague esta factura?"
"Eu sei, já não é o primeiro que... olhe...só se for pagar à nossa delegação de Alcobaça ou Leiria"

No ano passado instalei em casa um sistema de aquecimento central; embasbacado com a qualidade de vida que aquilo me trouxe, permitindo-me andar de manga curta nos dias de maior rigor invernoso, liguei o aquecimento ininterruptamente durante três ou quatro meses. Já se sabia o resultado. No fim do ano teria de acertar contas com a Companhia de gás. Assim foi. 1111 euros. Barato, para tanto bem estar.
Obedientemente, no dia aprazado lá fui pagar o que devo, mas no momento em que mostrei o cartão multibanco...

"Desculpe, Sr. Correia, mas não temos."

"Não posso pagar com multibanco?"
"Pois, não temos, não"
"Então, como é que?... Posso fazer uma transferência bancária, se quiser."
"Pois era, mas também não podemos."
"Isto é a lusitâniagás, certo? Do grupo GALP energia. O maior fornecedor de gás canalizado do país, certo?"
"Sim, tem razão, mas não podemos, acho que é por causa das taxas da unicre"
"Que... quer então que eu...?"

Saí dali e fui ao banco. Levantei mil cento e onze euros. Pedi, obviamente, notas pequenas. As mais pequenas eram de 10 euros.

Ao regressar, coloquei filmicamente o maço de notas na mesa (cena à Cagney) e, no momento em que iam pegar no dinheiro, interrompi o gesto e pedi:

"Só um momento." (Tirei, evidentemente, uma fotografia, que isto contado num blog, ninguém acredita.)




Ainda pensei em pedir para falar com alguém responsável, mas suspeito que me respondessem:

"Desculpe, Sr. Correia, mas não temos.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Otelo morreu, viva Otelo

Tal como diz uma amiga minha que lida diariamente com estas questões "banqueiras" é insofismável que sejam as empresas de rating aquelas que mais beneficiam com estas crises, que objectivamente detonam, com o propósito claro e distinto de todos lhes enchermos os bolsos. Se se soubesse o que se sabe hoje, a revolução de Otelo não apenas tinha começado muito mais cedo como ainda não terminaria. Terá, quem sabe?, recomeçado agora

Who does?...





Não creio que seja possível que qualquer um de nós possa deixar de acreditar num ideal. Qualquer que ele seja, possuir uma visão guiadora do que o mundo deve ser importa na vida de cada um de nós a mesma importância que damos, ou devíamos dar, à respiração.

Hoje, num jantar cá em casa, ao conversar com um amigo, professor universitário de música, tomámos ambos a consciência do dilema que se colocou a Brahms quando escrevia o seu requiem. Ser ou não ser crente em Deus não tem a importância de haver a importância de crer em Deus. Nesse sentido, criar uma obra de arte que desvenda essa segunda, e por conseguinte primeira, importância, adquire o mesmíssimo dever que respirar.

Antes de mais nada, ter um ideal é fazer ideia. E fazer ideia, (tê-la, por exemplo), é um acto explicitamente exorbitante. Porque refulge dessa asfixia que resulta de respirarmos sem ar.

Como se diz na última fase do abissal Blade Runner
"Too bad she won't live. But then again, who does?!"

segunda-feira, 21 de março de 2011

Remissão impossível

Contado, ninguém acredita. A minha mãe pede-me que vá com ela a Fátima. Ela sabe o que eu penso sobre o assunto, mas sabe também que, se mo pede, vou com ela de bom grado. Na verdade, creio que nem suspeita da minha esquizofrénica relação com as igrejas. Considero-as todas um exercício oligárquico de poder irracional sobre os mais desgraçados. Nutro uma incontrolável indiferença calvinista por quase toda a arte religiosa. Ao mesmo tempo, porém, nenhum outro lugar público me transmite tanta calma como as igrejas. Em Coimbra, passei centenas de horas na Sé Velha a estudar, por ser ali que, no mundo todo, melhor se sente a serenidade temperada da chuva, como do sol.

É este o sentimento que transporto comigo quando entro em Fátima. Ao subir aquele formidável santuário, a minha mãe guia-me até à lotada capelinha das aparições, onde dezenas de pessoas silenciam ladainhas do rosário e ouvem o sermão do pároco. Emocionada, a minha mãe presta contas íntimas com a vida. Eu fico cá atrás, parado a observar todo este ritual que quase nada me diz,  mas é-me óbvio perceber a dor e a catarse que aquele recinto produz.  Exorto-me, pois, ao silêncio. Chora-se muito por trás de óculos de marca. Deixo-me envolver nos dramas que eu mesmo fantasio.

Pois estou eu neste fingimento pessoano quando reparo, de repente, na camisola do homem que está à minha frente. Escrita em letras garrafais nas suas costas, leio a seguinte frase:

"Mother fucking mountaneer".

"Mother fucking mountaneer".

Tal e qual.

Como vos disse, contado, ninguém acredita. Por isso, decido-me tirar uma fotografia. Várias.

 

Motherfm

Note-se que a minha pulsão pela iconoclastia não é pequena. Mas também não esperava tamanho incentivo. Não consigo deixar de pensar que aquele homem decidiu, como a minha mãe decidira, ir a Fátima nesse dia. E, ao ter de decidir, nessa manhã, o que iria levar vestido, achou que, de todas as camisolas que tem, aquela seria a melhor camisola para levar ao santuário da mãe de Jesus Cristo. Aquela sim, aquela é que está bem. E, pelo que me é dado perceber, apenas eu reparo na insolência têxtil daquele tipo. É a mim, ao menos prosélito de todos quantos entraram naquele dia, naquele lugar, que a camisola parece incomodar.

Ficarei sempre boquiaberto com a impertinência descarada destes católicos postiços e descuidados que conheci a vida inteira. Já pensei em tudo o que possa absolver o tipo. De nada adianta. Creio que nem o faz por mal. Apenas faz e é e pronto.

Chamo a isto a "Remissão impossível". Que diabo. Bem sei que o Livro diz que Cristo teve de subir a uma montanha para proferir um sermão, mas também não creio que isso tenha feito dele um montanheiro incestuoso.

 

 

sexta-feira, 18 de março de 2011

Orbital

A messenger acaba de entrar na órbita de Mercúrio. Anda a tirar fotografias desde 2004. Vê-la a ligar o thruster a milhões de quilómetros daqui é desvanecedor. Que tempos estes.

Lição

Hoje conversei com a mãe de uma aluna minha. Uma mãe a valer. Ponderada, atenta, risonha e acutilante. Pobre, também. Muito. Mas de uma pobreza sem interferências no que deve ser a ponderação, a atenção, o humor e a objectividade de uma mãe. Que privilégio ter uma mãe assim. Naturalmente, os resultados saltam à vista, herdados de mãe para filha. Que torpeza uma mãe assim ter de pelejar tão desproporcionadamente contra a vida para a vencer com tamanha temperança. Que exemplo. O meu desejo para este ano é que eu saiba, como fez e faz a minha aluna tão bem, ter aprendido mais esta lição de vida.



sexta-feira, 4 de março de 2011

Possíveis impossibilidades

Fotografia

Como se esculpe a transparência?

É que...

A verdade é que cada vez me capacito mais de que não temos biografia. Apenas biologia. Haverá coisa mais perturbadora? Haverá coisa mais libertadora? Sobretudo hoje que morre a mãe de um amigo de alma?

quarta-feira, 2 de março de 2011

NASA space walk

Não sei se estão a ver isto. A gente vê as coisas com uma câmara instalada no capacete do astronauta. F a b u l o s o

Ordem nisto

Se existisse uma ordem dos professores ela seria mendicante?

space walk

A ver o space walk da discovery. 2 spacewalkers não se vê todos os dias. NASA.gov/ntv uma mulher coordena o passeio

sábado, 19 de fevereiro de 2011

guilty pleasure

Na exposição canina internacional com uma extraordinária fila de raças lusas. Não sou admirador destes controversos certames, mas adoramos cães e é irresistível. Ainda por cima com background music do George Benson. A minha bebé bate palmas. Qual polémica?

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

voto a voto, uma segunda volta

No Coliseu dos Recreios, em apoio de uma esquerda resistente, limpa, adversária e una.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

voto a voto, uma segunda volta

No Coliseu dos Recreios, em apoio de uma esquerda resistente, limpa, adversária e una.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Camões e Alegre

Em apoio de uma esquerda indispensável. Na Camões em Leiria com Manuel Alegre.